Os MONSTROS: GIGANTES, A ESFINGE, PÉGASO
E A QUIMERA, CENTAUROS, GRIFOS
E PIGMEUS
Os
monstros, na linguagem da mitologia, eram seres de partes ou proporções
sobrenaturais, em via de regra encarados com horror, como possuindo imensa
força e ferocidade, que empregavam para perseguir e prejudicar os homens.
Alguns deles imaginava-se, combinavam os membros de diferentes animais, como a
Esfinge e a Quimera. E a todos estes eram atribuídas às terríveis qualidades
dos animais ferozes, juntamente com a sagacidade e outras qualidades humanas.
Outros, como os gigantes, diferiam dos homens principalmente quanto ao tamanho;
e, nesse particular, devemos reconhecer que havia uma grande diferença entre
eles. Os gigantes humanos, se assim podiam ser chamados, tais como os Ciclopes,
Anteu, Orion e outros, não eram inteiramente desproporcionados com relação aos
seres humanos, pois se misturavam com os homens, em seus amores e lutas. Por
outro lado, os gigantes super-humanos, que guerreavam com os deuses, eram de
proporções muito mais vastas. Títio, contava-se, quando se estendia na planície
cobria nove acres1 e para cobrir Encélado foi preciso todo o Monte Etna.
Já falamos da guerra que os gigantes travaram com os
deuses e de seu desfecho. Enquanto durou essa guerra, os gigantes mostraram-se
inimigos temíveis. Alguns deles, como Briareu, tinham cem braços; outros, como
Tífon, soltavam fogo pela boca e pelas narinas. Em certa ocasião, fizeram tanto
medo aos deuses, que estes fugiram para o Egito e se esconderam sob várias
formas. Júpiter tomou a forma de um carneiro, pelo que depois foi cultuado no
Egito como o deus Amon, com chifres recurvados. Apolo transformou-se em um
corvo, Baco, em um bode, Diana, em uma gata, Juno, em uma vaca, Vênus, em um
peixe, Mercúrio, em uma ave. Em outra ocasião, os gigantes tentaram escalar o
céu e, para esse fim, colocaram o Monte Ossa sobre o Pélion. Afinal, foram
vencidos pelos raios, que Minerva inventou e ensinou Vulcano e os Ciclopes a
fazer para Júpiter.
A ESFINGE
Laio, rei de Tebas, foi advertido por um oráculo de que
haveria perigo para sua vida e seu trono se crescesse seu filho recém-nascido.
Ele, então, entregou a criança a um pastor, com ordem de que fosse morta. O
pastor, porém, levado pela piedade, e, ao mesmo tempo, não se atrevendo a
desobedecer inteiramente à ordem recebida, amarrou a criança pelos pés e
deixou-a pendendo do ramo de uma árvore. O menino foi encontrado por um
camponês, que o levou aos seus patrões. O casal adotou a criança, que recebeu o
nome de Édipo, ou Pés-Distendidos. Muitos anos depois, quando Laio se dirigia
para Delfos, acompanhado apenas de um servo, encontrou-se, numa estrada muito
estreita, com um jovem que também dirigia um carro. Como este se recusasse a
obedecer à ordem de afastar-se do caminho, o servo matou um de seus cavalos, e
o estranho, furioso, matou Laio e seu servo. O jovem era Édipo que, desse modo,
se tornou o assassino involuntário do próprio pai. Pouco depois desse fato, a
cidade de Tebas viu-se afligida por um monstro, que assolava as estradas e era
chamado de Esfinge. Tinha a parte inferior do corpo de leão e a parte superior
de uma mulher e, agachada no alto de um rochedo, detinha todos os viajantes que
passavam pelo caminho, propondo-lhes um enigma, com a condição de que passariam
sãos e salvos aqueles que o decifrassem, mas seriam mortos os que não
conseguissem encontrar a solução. Ninguém conseguira decifrar o enigma, e todos
haviam sido mortos. Édipo, sem se deixar intimidar pelas assustadoras
narrativas, aceitou ousadamente, o desafio. — Qual é o animal que de manhã anda
com quatro pés, à tarde com dois e à noite com três? — perguntou a Esfinge.
— É o homem, que engatinha na infância, anda ereto na
juventude e com ajuda de um bastão na velhice — respondeu Édipo.
A Esfinge ficou tão humilhada ao ver resolvido o enigma,
que se atirou do alto do rochedo e morreu.
A gratidão do povo pela sua libertação foi tão grande que
fez de Édipo seu rei, dando-lhe a rainha Jocasta em casamento. Não conhecendo
seus progenitores, Édipo já se tornara assassino do próprio pai; casando-se com
a rainha, tornou-se marido da própria mãe. Esses horrores ficaram
desconhecidos, até que Tebas foi assolada pela peste e, sendo consultado o
oráculo, revelou-se o duplo crime de Édipo. Jocasta pôs fim à própria vida e
Édipo, tendo enlouquecido, furou os olhos e fugiu de Tebas, temido e abandonado
por todos, exceto pelas filhas, que fielmente o seguiram, até que, depois de
dolorosa peregrinação, ele se libertou de sua desgraçada vida.
PÉGASO E A QUIMERA
Quando Perseu cortou a cabeça de Medusa, o sangue, caindo
sobre a terra, transformou-se no cavalo alado Pégaso. Minerva pegou-o e
amansou-o, dando-o de presente às musas. A fonte de Hipocreue, situada na
montanha onde viviam as musas, Hélicon, foi aberta por um coice daquele cavalo.
A Quimera era um monstro horripilante, que expelia fogo pela boca e pelas
narinas. A parte anterior de seu corpo era uma combinação de leão e cabra e a
parte posterior, a de um dragão. Causava grandes estragos na Lícia, de sorte
que o rei do país, lobates, procurava um herói para destruí-la. Naquela
ocasião, chegou à sua corte um jovem e bravo guerreiro, chamado Belerofonte,
que trazia carta de Proteu, genro de lobates, recomendando-o em termos
calorosos como um herói invencível, mas acrescentando, no fim, um pedido ao
sogro para mandar matá-lo. O motivo disso é que Proteu tinha ciúme de
Belerofonte, por desconfiar de que sua esposa, Antéia, nutria demasiada
admiração pelo jovem guerreiro. Ao ler as cartas, ficou hesitante, não
querendo violar as regras da hospitalidade, mas desejoso de satisfazer a
vontade do genro. Teve, então, a idéia de mandar Belerofonte lutar contra a Quimera.
Belerofonte aceitou a proposta, mas antes de entrar em combate, consultou o
vidente Polido, que o aconselhou a recorrer, se possível, para a luta, ao
cavalo Pégaso. Para esse fim, o jovem deveria passar a noite no templo de
Minerva. Assim fez Belerofonte e, enquanto dormia, Minerva procurou-o e
entregou-lhe uma rédea de ouro, que se encontrava na mão do jovem quando ele
despertou. Minerva mostrou-lhe, também, Pégaso bebendo água no poço de Pirene,
e, mal avistou a rédea dourada, o cavalo aproximou-se docilmente e se deixou
cavalgar. Nele
montado, Belerofonte elevou-se nos ares, não tardou a encontrar
a Quimera e obteve uma fácil vitória sobre o monstro. Depois de vencer a
Quimera, Belerofonte foi exposto a novos perigos e trabalhos por seu pouco amável
hospedeiro, mas, com a ajuda de Pégaso, triunfou em todas as provas, até que
Iobates, vendo que o herói era particularmente favorecido pelos deuses, deu-lhe
sua filha em casamento e tornou-o seu sucessor no trono. Afinal Belerofonte,
por seu orgulho e presunção, incorreu na ira dos deuses; chegou segundo se
conta, a tentar voar até o céu em seu corcel alado, mas Júpiter mandou um
moscardo atormentar Pégaso. O cavalo atirou ao chão o cavaleiro, que, em
conseqüência, se tornou coxo e cego. Depois disso, Belerofonte vagou sozinho
pelos campos aleanos, evitando o contato dos homens, e morreu miseravelmente.
Milton faz alusão a Belerofonte no começo do sétimo livro do Paraíso
Perdido:
Desce, Urânia, ao céu (se,
realmente, Deves por este nome ser chamada),
Tu, de cuja voz divina ao
apelo,
Subi além do Olimpo, além
dos cimos
Que Pégaso alcançara com
seu vôo,
E, assim, por ti levado ao
céu supremo,
Respirar atrevi o ar do
Empíreo
(Teu elemento), eu, mortal
humilde,
Faze-me voltar, agora, tão
seguro
Como quando parti, ao chão
da terra.
Não permitas, Urânia, que,
caindo
Do fogoso corcel que ora
cavalgo
(Como Belerofonte, de uma
altura
Muito menos caído),
abandonado
Venha me ver nos campos
aleanos,
Sem saber dirigir os próprios passos.
Como cavalo das musas, Pégaso esteve sempre a serviço dos
poetas. Schiller conta-nos, a propósito, uma história pitoresca, segundo a qual
um poeta necessitado vendera o cavalo, que foi destinado a puxar a carroça e o
arado. Pégaso não se adaptou a tal serviço e seu rústico dono não viu serventia
para o animal. Um jovem, contudo, pediu-lhe que o deixasse experimentar. E, mal
o cavalgou, o animal, que a princípio se mostrava indomável e depois apático,
ergueu-se majestosamente, como um espírito ou um deus, desdobrou o esplendor de
suas asas e voou para o céu. Também Longfellow recorda uma aventura do famoso
corcel em seu poema "Pégaso no Lago". Shakespeare faz alusão a Pégaso
no "Henrique IV", onde Veron descreve o Príncipe Henrique:
De elmo e armadura lhe
cobrindo o corpo,
O jovem Henrique vi do chão
erguer-se,
Tão destro quanto o alígero
Mercúrio,
E o corcel cavalgar,
airosamente,
Como se fosse um anjo que
das nuvens
Caísse e um cavaleiro se
fizesse,
Para um fogoso Pégaso
domar.
Os CENTAUROS
Estes monstros tinham do homem
a cabeça e o tronco e o restante do corpo do cavalo. Os antigos apreciavam
muito o cavalo para considerar que sua união com o homem constituísse uma forma
degradante e, assim sendo, o centauro é o único dos monstros mitológicos da
antigüidade ao qual eram atribuídas boas qualidades. Os centauros eram
admitidos na companhia dos homens, e estavam entre os convidados, no casamento
de Píritos com Hipodâmia. Na festa, Eurátion, um dos centauros, tendo-se
embriagado com vinho, tentou violentar a noiva; os outros centauros seguiram
seu exemplo, provocando um terrível conflito, no qual vários deles foram
mortos. E a célebre batalha dos lápites e centauros, assunto favorito dos
escultores e poetas da antigüidade. Nem todos os centauros, porém, eram
semelhantes aos grosseiros convidados de Píritos. Quíron recebeu lições de
Apolo e Diana, tornando-se famoso por sua habilidade na caça, medicina, música
e arte da profecia. Os mais notáveis heróis da Grécia foram seus discípulos,
entre eles o menino Esculápio, que lhe foi confiado por seu pai Apolo. Quando o
sábio voltou para casa levando a criança, sua filha Ocíroe veio ao seu encontro
e, vendo a criança, começou a profetizar (pois era profetisa), prevendo a
glória que ela iria conquistar. Esculápio, depois de adulto, tornou-se médico
famoso e, em um caso, chegou mesmo a restituir a vida a um morto. Plutão
irritou-se com isso e, a seu pedido, Júpiter fulminou ousado e atrevido medico com um
raio, mas, depois de sua morte, recebeu-o entre os deuses. Quíron foi o mais sábio
e justo dos centauros e, quando morreu, Júpiter colocou-o entre as estrelas,
como a constelação do Sagitário.
Os PIGMEUS
Os pigmeus constituíam uma nação de anões e seu nome
deriva de uma palavra grega que significa uma medida correspondente a cerca de
treze polegadas,3 que segundo se acreditava, era a altura daquela gente. Os
pigmeus viviam perto das nascentes do Nilo, ou, de acordo com outros, na índia.
Homero conta que os grous costumavam emigrar, todos os invernos, para o país
dos pigmeus e seu aparecimento era o sinal de uma sangrenta guerra com os
diminutos habitantes, que tinham de pegar em armas para defender os trigais
contra os rapaces estrangeiros. Os pigmeus e seus inimigos, os grous, serviram
de assunto a diversas obras-de-arte. Escritores mais modernos falam de um
exército de pigmeus que, encontrando Hércules adormecido, preparou-se para
atacá-lo, como se se tratasse do ataque a uma cidade. O herói, contudo, tendo
despertado, riu dos minúsculos guerreiros e, embrulhando alguns em sua pele de
leão, levou-os para Eristeu. Milton utiliza-se dos pigmeus para uma comparação
no Livro do Paraíso Perdido:
Os pigmeus que vivem além
da índia
Ou os Elfos gentis, cujos
folguedos
Os camponeses vêem (ou
sonham ver)
Nas clareiras da mata e
junto às fontes.
O GRIFO
O grifo era um monstro com corpo de leão, cabeça e asas
de águia e as costas cobertas de penas. Construía ninhos, como as aves, mas, em
vez de um ovo, punha no ninho uma ágata. Tinha garras de um tamanho tal que os
habitantes da índia, país onde se acreditava viver o grifo, delas faziam taças.
Os grifos encontravam ouro nas montanhas e com ele fazia seus ninhos, razão
pela qual esses ninhos despertavam grande interesse entre os caçadores e tinham
de ser vigiados com atenção. O instinto levava os grifos, a saber, onde havia
tesouros escondidos e eles tudo faziam para manter os saqueadores e ladrões à
distância. Os arispianos, entre os quais viviam os grifos, eram um povo da
Cítia, de um só olho. Milton faz uma comparação baseando-se nos grifos, no
Livro II do Paraíso Perdido:
Como quando na selva um
grifo alado
Através de colinas e
charnecas,
Persegue o arispiano que
seu ouro
Se atreveu a juntar.
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